A espera.
Guardarei esta espera na memória. Guardarei até que tudo acabe e o planeta deixe de ter vida. Guardarei até que a terra seque e eu, centenária, morra. Sentado, horas a fio, de olhar vago e coração solitário, o Manuel espera. Para ele, a vida já deixou de ser vivida.
Aqui mesmo, neste lugar, onde perduro, ouvi juras de amor, palavras de carinho e vi momentos de ternura. Aqui brincaram crianças, correram, treparam-me, soltaram gargalhadas. Aqui, à noite, no Verão, viam-se as estrelas, contavam-se histórias, planeavam-se os dias, confidenciavam-se sonhos e viam-se beijos, abraços e carícias. Mas, nem todos os dias eram felizes, também se viveram momentos difíceis, horas em que se tinham que tomar decisões, dias em que não era fácil olhar em frente. Foram verbalizadas palavras e tomadas atitudes que magoavam. Mas, as feridas, mais tarde ou mais cedo, saravam.
E hoje, sentado, horas a fio, frente à casa, outrora caiada de fresco, o Manuel espera. Olha o infinito, sem pensar em nada, sem desejar nada, sem planear nada. Espera como se ela um dia voltasse. Espera como se ela pudesse sair de casa e chamar por ele, a resmungar entre dentes, que o almoço já estava frio.
[Ficção - Life Moments]
* Fotografia by Alexandre Cibrão - www.acibrao.com